10 referências sobre fact-checking para pesquisas e trabalhos acadêmicos

Por Taís Seibt*

Com certa frequência, estudantes de graduação e pós-graduação me consultam em busca de referências para projetos de pesquisa e trabalhos acadêmicos em geral sobre fact-checking. Resolvi aproveitar a proximidade com o Fact-checking Day – Dia Internacional da Checagem -, celebrado em 2 de abril, para listar 10 referências que podem ajudar a guiar principalmente pesquisadores novatos em estudos sobre desinformação

1. Information Disorder 
(WARDLE; DERAKHSHAN, 2017)
Publicado em 2017 pelo Conselho da Europa, o relatório “Information Disorder: Toward an interdisciplinary framework for research and policy making” é uma leitura básica. Tendo como autora Claire Wardle, diretora-executiva do First Draft e uma das pioneiras nos estudos sobre desinformação, com coautoria de Hossein Derakhshan, o documento apresenta conceitos fundamentais para entender o fenômeno da desordem informacional e suas implicações na mídia e na democracia. Além disso, indica como diferentes atores e instituições sociais poderiam/deveriam atuar frente a essa realidade.  

2. Journalism, fake news and disinformation
(IRETON; POSETTI, 2018)
Editado por Cherilyn Ireton e Julie Posetti, este guia da Unesco tem entre seus colaboradores Alexios Mantzarlis, que era diretor da International Fact-checking Network (IFCN), a própria Claire Wardle, do First Draft, entre outros. Há uma versão em português também. É organizado como um manual de formação em jornalismo, desinformação e fact-checking, por isso tem uma abordagem mais didática, e traz muitas referências úteis.

3. Como as plataformas enfrentam a desinformação 
(BARBOSA; MARTINS; VALENTE, 2020)
Ainda na série de produções que ajudam a entender o contexto, esta é uma referência interessante em português. Produzido pelo Intervozes, o relatório “Fake News: Como as plataformas enfrentam a desinformação” descreve e analisa políticas de combate à desinformação adotadas desde 2018 pelas principais plataformas de redes sociais – Facebook, Instagram, WhatsApp, YouTube e Twitter. É uma síntese de como cada um desses atores entende (ou pensa que entende) o fenômeno e o que eles fazem com isso. 

4. As fake news e a nova ordem desinformativa na era da pós-verdade
(FIGUEIRA; SANTOS, 2019)
Uma ótima referência em português é esta coletânea organizada por João Figueira e Silvio Santos, que traz autores de referência no Brasil e em Portugal para debater a desordem informacional sob diferentes perspectivas. Além do idioma, também o contexto da produção aproxima as reflexões sobre o fenômeno com a nossa realidade, já que a maior parte das produções tem como referência Europa e Estados Unidos. A convite da Reciiz, periódico da Fiocruz, escrevi uma resenha sobre a coletânea. Pode ser útil para guiar a leitura.

5. Os engenheiros do caos
(EMPOLI, 2019)
Cheguei a esta referência por indicação da minha colega Marília Gehrke, quando estávamos produzindo o site e e-book de educação midiática Postar ou Não? (se não baixou ainda, aproveita). O subtítulo é quase um resumo do que você encontra na obra: “Os engenheiros do caos: Como as fake news, as teorias da conspiração e os algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições”. De vídeos conspiracionistas sobre Zika Vírus ao Brexit, os casos analisados pelo autor ajudam a entender o que está acontecendo – e por que apenas checar fatos não resolve a questão.

6. Social Media and Democracy
(PERSILY; TUCKER, 2020)
Falando em impactos políticos e risco à democracia, esta coletânea publicada pela Universidade Cambridge não só trata de desinformação, checagem de fatos e discurso de ódio, mas também de regulação, moderação e propaganda em mídias sociais, entre outras abordagens multidisciplinares. 

7. Deciding what’s true
(GRAVES, 2016)
Especificamente sobre fact-checking, o livro de Lucas Graves, cujo título remete a Herbert J. Gans (Deciding What’s News), documenta o surgimento e o crescimento do fact-checking no jornalismo político estadunidense, situando-o como um movimento de reforma do jornalismo na era digital. Ele apresenta em detalhes os métodos, rotinas e princípios da checagem de fatos, a partir das práticas dos pioneiros nos EUA, com ênfase no PolitiFact, um dos principais responsáveis pela disseminação desse formato pelo mundo. O trabalho de Graves também pode ser acessado em sua versão original no repositório da Universidade Columbia, mas a tese foi defendida em 2013 e o livro traz atualizações.

8. Jornalismo de verificação como tipo ideal
(SEIBT, 2019)
Como me inspirei bastante no trabalho de Graves, tomo a liberdade de indicar minha tese na sequência. Em “Jornalismo de verificação como tipo ideal: a prática de fact-checking no Brasil”, que recebeu menção honrosa no Prêmio Capes de Tese 2020, documento a criação e o status à época das três iniciativas pioneiras de checagem no Brasil – Aos Fatos, Lupa e Truco – quanto a seus métodos e rotinas de checagem. A partir do estudo de caso com “participação observante” no Truco, busco explicações mais amplas para a mudança estrutural em curso no jornalismo, que vai muito além do fact-checking enquanto formato. É daí que vem o “jornalismo de verificação” como tipo ideal, um modelo teórico para pesquisar a mudança. Aqui tem um resumo.

9. Em busca da credibilidade perdida
(SALLES, 2019)
Outra tese defendida em 2019 é da Cecília Almeida Salles. Também inspirada pelo impacto da desinformação nas práticas jornalísticas, ela entrevistou jornalistas da piauí e da agência Lupa para entender o rito de produção jornalística quanto ao tempo de criação, narratividade, transparência e correção. No contexto da desinformação, essas novas formas de narrar poderiam ajudar o jornalismo a retomar a credibilidade perdida e fortalecer a democracia, segundo a autora.

10. Fake News na eleição presidencial de 2018 no Brasil
(DOURADO, 2020) 
Já o trabalho de Tatiana Dourado é menos sobre o jornalismo e mais sobre a dinâmica das redes de desinformação. Ela analisou fluxos de conversação política nas redes sociais para entender como se dava o engajamento em torno de “fake news”, termo que tratou de conceituar na pesquisa, apesar das controvérsias em torno da expressão: fake news são mensagens que forjam evidências para serem lidas como novidades, geralmente urgentes e de interesse público. Tatiana falou sobre a pesquisa em entrevista à Afonte.

Nos últimos dois anos, o ritmo de produções sobre desinformação e checagem de fatos se acelerou muito e nem sempre conseguimos acompanhar em tempo real o que os colegas estão pesquisando. Por isso, esta lista de referências não é definitiva. Procurei destacar algumas produções mais abrangentes, que ajudam a entender o contexto, e estudos que podem ser tomados como pioneiros, por terem sido desenvolvidos em um período em que o fenômeno ainda era pouco pesquisado e, de certa forma, até minimizado pela academia. Se você sentiu falta de algum trabalho ou quer indicar uma referência, pode me escrever. Sugestões de leitura são sempre bem-vindas.

*Taís Seibt é jornalista, professora da Unisinos e doutora em comunicação pela UFRGS. Sua tese de doutorado “Jornalismo de verificação como tipo ideal: a prática de fact-checking no Brasil” recebeu menção honrosa no Prêmio Capes de Tese 2020.